Capítulo 2

Agora, para ser claro: sim, o plano é falar a real, mas não vou explicar tim-tim por tim-tim. Vou falar das coisas mais importantes, claro, mas o que eu quero é dar uma ideia de… uma ideia de mim. Porque quando você me entender, vai entender também de onde eu venho, por que faço as coisas que faço e por que fiz o que fiz.

Então, leia nas entrelinhas se precisar, mas, no fim das contas? Tudo o que importa deve estar evidente. Se não achar, é porque você não prestou atenção.

Lá vai…

Nós, os Exos, somos assombrados.

Sinistro, eu sei — e talvez um pouco exagerado. Mas, sem brincadeira, é a melhor palavra. Ela meio que define a situação de um jeito que os fatos puros não conseguem.

Veja bem, todos os Guardiões têm vidas passadas. Mas, a menos que você tenha retornado com informações precisas sobre sua pessoa ou alguém próximo (você mesmo, Bray), aquela vida ou aquelas vidas passadas foram totalmente apagadas. Eliminadas. Renascido na Luz e tudo mais, você se torna o que tiver de se tornar.

Os Exos?

Nós temos fantasmas nas nossas máquinas. Não Fantasmas com F maiúsculo, que "abrem portas e sabem das coisas". São, tipo, fragmentos de… sei lá, partes de algo que poderia ser memória. Seja lá o que for, funciona como ponto de partida para, talvez, possivelmente, imaginar quem éramos antes de sermos quem somos hoje. Sem falar dos sonhos, mas não cutuco isso nem com um Bastão de Arco de três metros.

Eu? Sou um dos poucos sortudos. Eu não tinha só uns flashes nebulosos daquela antiga vida de Exo para seguir em frente. O negócio é que o "eu" que estava em minha vida antes do meu Fantasma com F maiúsculo me encontrar escrevia diários, como lembranças — fragmentos da vida anterior, que me deram uma ideia de quem eu era.

Os diários são pessoais e ficam guardados perto do meu peito. Claro que já compartilhei algumas páginas, mas só com as pessoas certas, que percebiam o valor de conhecer o homem por trás do mito.

Sim, eu disse "mito". Quem estamos enganando? Você já ouviu falar de mim. Quem nunca ouviu? A questão é… Eu não fico ostentando minha vida pessoal por aí.

Primeiro, porque é coisa MINHA. Segundo, porque o Azulão não curte quando os Guardiões ficam fuçando a vida anterior. Tem a ver com dever, regras, não perder de vista o motivo da gente ter sido escolhido. Acima de tudo… o fato de que a maioria dos "Escolhidos" não tem o luxo de ter um passado. Então, ficar esfregando isso na cara dos outros não é certo.

Olha só, tudo o que eu sei é…

Quando eu voltei para a terra dos vivos, a minha versão pré-Luz fez a gentileza de me dar uma mãozinha. Peguei essa mãozinha, dei um "toca aqui" e segui esse exemplo da melhor forma possível.

Após todo esse tempo, posso até não saber meu verdadeiro propósito — deixo questões existenciais e sublimes pros Arcanos — mas o que eu sei é…

Minha vocação é fazer o bem. Não necessariamente "ser" sempre bom, sabe, mas fazer o bem. É diferente.

E, se minhas atitudes nem sempre se encaixam nas definições de "herói" ou "espírito de equipe" — é você mesmo, Azulão —, saiba que…

Posso até fazer as coisas do meu jeito, mas estamos todos no mesmo barco…

Ou coisa assim.